Dia 39 de Janeiro de 2024
O mês foi tão largo e com tantos acontecimentos, acho que amanhã celebrarei Ano Novo novamente.
Ocorreu-me o pensamento de que estabelecer este ano como “O Ano da Escrita Mágica” (fazendo alusão à tradução do livro de Nina Sankovitch) foi um mau presságio, porque assim como aquele foi um ano intenso para ela, este promete ser um ano intenso para mim.
Já é impossível voltar atrás na decisão de escrever todos os dias, a cada obstáculo vem a vontade de colocá-lo como parte do livro que narra essa jornada. Pode ser apenas uma ilusão imaginar esse segundo livro (o primeiro é a história de mistério a qual me dedico agora), acredito que só descobriremos em uns anos.
Porém, o resumo do mês de janeiro já parece um compilado de histórias familiares. Como eu já disse algumas vezes em textos anteriores, parece que a vida imita a arte, eu consigo pensar em exemplos literários similares a alguns acontecimentos específicos, não apenas na minha vida, mas na vida de pessoas ao meu redor também.
O mês começou com o batizado da minha filha, logo em seguida houve certas dificuldades familiares, notícias de que a família vai crescer, um amigo jovem faleceu, a avó foi internada, outro amigo descobriu um câncer, preparação para dois casamentos, a promessa de um reencontro, a incerteza do futuro.
Então chegamos à reta final deste mês. Com a boa notícia da alta da avó, ao mesmo tempo que a promessa de reencontro foi frustrada, mas por um bom motivo.
Me encontro diante de um ponto de escolhas, sem ter a plena certeza de suas consequências, apenas àquilo que minha imaginação consegue alcançar. E não são escolhas fáceis, são justamente aquelas cuja decisão abrirá um caminho sem volta, apenas com diferentes ramificações.
Perdoe-me se falo difícil, mas já não acredito que nossas decisões têm um caminho de retorno. É diferente quando falo de escolhas pequenas, tomar ou não café, com ou sem açúcar, comer determinado alimento ou não, fazer exercícios ou não. Digo pequenas porque para que sejam visíveis, as consequências/resultados são uma soma dessas pequenas decisões. Ainda assim, escolher um ou outro caminho deixa suas marcas, no corpo, na mente, sendo possível mudar de escolha, mas já não retornar ao ponto inicial.
A encruzilhada atual envolve trabalho, estudos, mudança. Inclusive coloca à prova minha escrita. Me pergunto se será um desafio para demonstrar a mim mesma (a quem mais, afinal?) a minha paixão pela escrita, por contar histórias.
Este mês comecei a ler Paula, de Isabel Allende, e me identifiquei com esse trecho:
“Mi vida se hace al contarla y mi memoria se fija con la escritura; lo que no pongo en palabras sobre papel, lo borra el tiempo.”
Não sei vocês, mas para mim é um trecho tão bonito e fala tanto com o que eu sinto com relação à escrita (e também com a minha péssima memória), que já deve ser a quinta vez que retorno a lê-lo. Em meio a esse turbilhão de acontecimentos e ter que reinventar o plano anual e suas metas, às vezes é bom sentir-se identificado.
Melhor ainda é sentir satisfação ao ver que pequenas metas foram cumpridas, recarregar o ânimo necessário para enfrentar outro mês, outro dia. Agora em janeiro consegui ler Noites Brancas, de Dostoiévski, o conto O Assassinato da Colina D, de Edogawa Ranpo, ao mesmo tempo comecei e continuo a leitura de Paula, de Isabel Allende e Fundação de Isaac Asimov. Em outros tempos jamais acreditaria que eu conseguiria ler tanto nas minhas circunstâncias.
Tive meus dias perdidos, mas escrevi ao menos 50% do mês e em cada momento que podia fechar meus olhos e imaginar (momentos raríssimos na vida de uma mãe), conseguia pensar no meu protagonista, onde ele estava? O que estaria fazendo? O que estava buscando? Ao final não escrevi 300 palavras por dia, mas posso dizer que tenho um bom apanhado de notas, escutei muitas dicas de cursos de escrita, a maioria delas belos exemplos do que não se fazer.
A cada regra que um coach de escrita diga que você deve usar para escrever (qualquer coisa, ficção ou não), imagine exemplos de bons autores que fizeram o exato oposto e esqueça essa ideia de escrever engessado. Escreva, use as técnicas que quiser, mas não venha dizer ou pensar que a escrita jamais pode ser feita de uma maneira diferente, porque com toda certeza alguém já subverteu essa regra.
Os melhores conselhos em relação a escrita eu encontrei em Para ler como um escritor, de Francine Prose, onde ela faz as indicações clássicas das oficinas de escrita e também exemplos de autores maravilhosos que não as seguem.
Algo dentro de mim olha para trás e diz: escreva, não deixe de escrever, ainda que ninguém leia, seja um pouco como o bambu japonês. Veja que belo foi esse mês carregado de emoções e acontecimentos, com pinceladas de literatura. Algum fruto vai resultar dessa decisão de escrever todos os dias, mesmo que seja apenas um sorriso solitário e uma sensação de preenchimento ao olhar para trás e ver o que construí, palavra por palavra.
Uma foto de um filhote de pug de roupinha para aquecer os corações nesse fim de mês e animar-nos para o seguinte.
Até a próxima.